domingo, 14 de dezembro de 2008

apenas um causo

vitrola1



Chico do mato viveu no século passado, lá no canto das Minas Gerais, criatura polêmica, era admirado por uns e odiado por outros. Chico adorava comer carne de porco, nunca de boi, dizia que o boi era de Deus, morava com a mulher no bairro das Perobas, lugar distante da cidade e onde o progresso ainda não havia chegado, fora o trabalho o que mais gostava de fazer era ouvir sua vitrola. Eles não tinham filhos, diziam que Maria era maninha e não podia criar. Nos domingos lavava o pé com sabão de cinza, cortava as unhas e navalhava as barbas e o bigode, colocava água de cheiro, ia até o armário da cozinha, pegava de traz da panela de ferro de três pés o litro da cachaça de salinas, coisa preciosa que tinha ganhado de um antigo patrão. Tomava duas boas talagadas e guardava a preciosidade, colocava o disco bolachão do Cascatinha e Inhana e começava a sonhar. Sonhava com dias de chuva, de lavoura verde, pés carregados de café e o pasto cheio de gado. Só acordava quando a mulher o cutucava para o almoço. Em uma segunda-feira, era verão de 67, Chico acordou de mau jeito, 5 horas da manhã e o galo não havia cantado, pulou da cama de palha e foi lavar o rosto na bica do terreiro, passou pela cozinha, o fogão a lenha estava apagado, em 23 anos de casado nunca tinha acontecido tal pirraça, procurou pela mulher por 7 dias e 7 noites, percorreu toda redondeza, ninguém tinha visto nem rasto. A desgraçada havia levado todas as galinhas, dois porcos castrados, o cavalo e a égua, três garrotes e o que tinha de mantimentos, só ficou o cachorro vital. Chico ficou desolado, não entendia o feito, Maria era mulher de respeito, nunca queria ir à cidade, era devota de São Benedito, nunca falava alto. Aquilo só podia ser coisa do diabo. Foram anos difíceis, sem a mulher para ajudar na lida, parecia que a diaba tinha levado toda a sorte, teve chuva de vento e geada, as vacas que sobraram não pariram, até a queimada do vizinho entrou pelas terras lambendo quase todo o cafezal. Chico nunca mais foi à cidade, vivia apenas com a companhia do cachorro vital, tinha vergonha de olhar nas pessoas, não vendia nem comprava nada. Foi num dia de domingo santo que o compadre Bernardino entrou na cozinha de Chico, bateu nas suas costelas magras e disse “Chico, eu sei onde a Maria está”. O sofrido homem foi achar a mulher a três cidades adiante, ela trabalhava de lavadeira em um bordel e tinha um amigado preto de nome Benedito. Só depois de ter enfiado a faca no cabra até o cabo, lembrou que era o vendedor de santo que passava na roça. Maria ficou amarrada vendo o Chico matar o preto, de um só golpe cortou o pescoço da mulher. Chico foi preso dois dias depois, sentado na cadeira de sua cozinha, ainda sujo de sangue. O cachorro vital acompanhou seu dono ate a cadeia e lá na porta ficou ate sair seu caixão. Contam que até hoje a meninada da escola, leva a sobra da merenda para um velho cão, de nome vital, no portão do cemitério de uma pequena cidade das Minas Gerais.

domingo, 30 de novembro de 2008

Reflexão

criacao_michelangelo





“... Sou o novo, sou o antigo


Sou o que não tem tempo


O que sempre esteve vivo


Mas nem sempre atento


O que nunca lhe fez falta


O que lhe atormenta e mata


Sou o certo, sou o errado


Sou o que divide


O que não tem duas partes


Na verdade existe ...”


Mal necessário (Mauro Kwitko)


 

domingo, 16 de novembro de 2008

mesa de chá




  

gota20em20vermelho


Ainda era madrugada


O velho ainda não dormia


Pensava no vento, na lanterna vermelha que tremulava na varanda


Presságio ! uma visita...


acender o fogo.


Encheu-se de ânimo,


cambaleou até o fogão a lenha.


As brasas adormeciam no frio.


Um sopro.


e uma chama abotoou no graveto de lenha


tempo, vento, vapor...


o coração doía, 


tirou a poeira do serviço de chá.


já era madrugada


e o velho ainda não dormia ...


apenas uma xícara suja ficou esquecida na mesa.


 


 

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Jardim do edem

anjo


Palavras eram ditas, gestos eram declinados, ela não sentia, não ouvia, apenas olhava como se fossem apenas gestos, apenas palavras.


Alguma pessoa uma vez disse “cuidado com quem muito sofre, o sofrimento anestesia a alma”.


docilmente alguém falava que o tempo é o melhor remédio para todos os males. Com os olhos perdidos no teto, lembrava da maçã vermelha nas mãos sujas da menina marina. As unhas pretas de terra seguravam a fruta com tanta força... Levava aos dentes pequeninos, lascavam, mascavam, degustavam com tanta fúria e gozo que não existia nada no mundo que pudesse tolher aquela cena. Ela tinha olhos de girassol, ela tinha boca de beijo.


Por um momento o tempo parou, gargalhadas foram ouvidas, os olhos parados ainda continuavam no teto, reprovação e espanto,  o som do riso deu lugar a um berro lancinante que varria o silêncio da alcova.


Marina voou, voou... nunca mais voltou... quem encontrar é favor me avisar ... ela é toda amarelinha ...  o meu pobre passarinho.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

às moscas

moscas

Para aqueles que pensaram que este modesto blog está às moscas, digo que não, apenas me encontro em estado de reflexão para uma próxima temporada de posts.

Me faltam idéias as vezes, mas nunca deixo de vir conferir minhas obras, o botica do anjo está bombando em média de 70 a 120 visitas por dia.

Me aguardem ...

domingo, 14 de setembro de 2008

poema dos 3 meses



Muitas saudades contidas e vivas ...


o dorso da língua te procura nas


noites que você nunca vem...


Olhos úmidos revelam  a distância


toda vez que vai embora.


Passo a contar os dias.


O desejo explode num gozo de todos os sentidos.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

azul e verde


O bloco de anotações amarelo ao lado do telefone lembra-me a proximidade entre os convites e os endereços...


Porque não lembrar do amarelo solar, era noite?


 mas o brilho estava nos olhos dos amantes.


A    cueca cinza do outro lado da porta lembra-me a ausência de banhos e o corpo destituído e nu.


Hipnotizado  pelo desejo dos  viajantes o  vermelho encarna e entoa ruído indecifrável.


Os lençóis brancos em cima dos movimentos lembram-me a fusão do azul com o verde.


tempo, tempo, tempo...


agora o azul é só azul e o verde é só verde.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

bons sonhos

tenha bons sonhos com a lua e ismael lô.


"não quero sonhar com a lua


quero sonhar com você


dormindo no meu peito


puro como um anjo  e tentador como um daimon...a me provocar"


 

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

a hora





...Cansa ser, sentir dói, pensar destruir.
Alheia a nós, em nós e fora,
Rui a hora, e tudo nela rui.
Inutilmente a alma o chora... (fernando pessoa)



 


a hora


rola na cadeira de reclinar


a  despedida


suporta a ausência


a mente nebulosa


dorme ao som da luz do metal


o sorriso complacente  ainda vive a espera da volta


os dias param de passar


esperam amordaçados na hora



 ora a hora nunca mais.

sábado, 2 de agosto de 2008

eu entendo sim - por Marcos Murta


 "acontece que o desejo de não estar sozinho bate de repente. A gente quer sair. E foi  nesse lugar de desejar estar  junto que, me parece, aconteceu a metamorfose..." Rubem Alves


 eu entendo  sim


seu sentimento entrou


e mudou o que era solidão


o que era certeza


o que estava predestinado


seu sentimento teimoso...


seu sentimento chegou e inundou um coração árido


que quase morre afogado de emoção e que tem medo


medo de amar


medo de ser amado


medo da vida


medo de mim


como se fosse  proibido sentir




 

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pena


perder de vista


apenas tocar na distância


não sentir  


tanto querer


você nunca vai entender.


 


noites úmidas


sentir a falta de ter


você nunca vai entender


 


roçar dos dedos e


ouvir a voz que enche o ar  


você nunca vai entender


 


acreditar no amanhã de ontem


e ver –se frente a frente  


nós


]você nunca vai entender.


 


que pena !!!


pena de nunca entender.  


 

domingo, 20 de julho de 2008

A Bailarina

bailarina2


 


Em 1881 quando Degas exibiu sua bailarina, foi um escândalo na sociedade parisiense, queriam manda-la pra o museu de zoologia ou de anomalias humanas, consideravam a escultura com olhar obsceno, o formato do rosto foi comparado aos piores bandidos e assassinos daquela época.


O artista levou para dentro dos salões de arte um espécime de olhar atrevido, moldado em cera e composto de  tecido e cabelo humano(materiais inéditos e considerados vulgares), retratava de forma crua,  uma jovem esquálida,  de aproximadamente 14 anos de feições não nobres.


O artista escandalizou quando mostrou de forma realista e nua a hipocrisia  dos poderosos que ao financiavam as artes dos  balés se beneficiavam com a prostituição infantil das bailarinas.


 127 anos depois no sul das Américas, crianças esquálidas, de semblantes morenos, com menos de 14 anos são leiloadas para satisfação do turismo sexual dos europeus. São  pequenas bailarinas e malabaristas de instrumentos torpes, são dançarinas da quadrilha  dos poderosos degenerados.


São nossas pequenas meninas, de olhares atrevidos.


 

sábado, 12 de julho de 2008

Pesoa


 


A poesia é triste


A poesia existe.


Quando o poeta é feliz


A poesia peca.


Quando tudo arde de paixão


Sinto as palavras irem para longe.


Já dizia Pesoa


Só existe poesia na angústia


Desculpe-me poeta maior


Que morra a poesia


Estou feliz com meu amor

terça-feira, 17 de junho de 2008

Verde


A mata pariu no meio do seio vermelho
iluminado dia de outubro que trouxe para mim ?
foi a brisa que caiu da árvore molhada de rio
verteu para o meu peito temperado de rosa
veio com os pés quentes de menino dourado
aqueceu minha nuca gelada
de neve da solidão
mexeu com meu sangue
ardeu o meu sexo
regou minha vida
fez-se verde

quinta-feira, 12 de junho de 2008


Quando me encara com essa boca


fico azul amarelado


me acompanha por entre a  multidão


e eu só solidão


escoro na parede molhada


encurto o caminho da volta


vou desvirtuando a noite


por entre as gargalhadas da rua


chuto o cão e viro  a lata


dou graças e te perdôo


mais uma vez.


Queria a tua distância


que me violenta e me castra


da felicidade


do encanto


de  ter sua boca


que me encara e não suplica. 

sexta-feira, 30 de maio de 2008

retornável e descartável






















retornar um dia seria um erro.


retornar é voltar e sentir de novo


o cheiro da flor, o travo da jabuticaba verde


 o mistério de caçar casulo


andar descalço no quintal de pedra


e sentir a dor da picada de abelha no pé


retornar  é ressurreição


é restauração de coisas que foram ruins


das pancadas na cabeça, das migalhas da sua mesa.


retornar é sentir sede e a garganta seca


é se perder até não poder


é suar de  tesão no meio do bambuzal.


retornar é voltar a ter medo


de cá do muro


ornado da cruel tortura  


da  idade infame.


retornar é ouvir o eco do  berro


do xingo


dos meninos da escola.


retornar é arrancar a ruga


é não querer voltar nunca.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Mãe


fabricar o ser, torna o vínculo anímico.


o desconforto


dores


são esquecidas no momento da troca dos olhares


entre a cria e a criadora.


no meio de porcarias, cheiro desagradável, choros intermináveis,


noites mal dormidas e a insegurança da criação, 


nasce a correspondência e a cumplicidade dos dois seres.


amor materno.


o homem


traz em si  a  invídia natural  o vazio maternal,


jamais algo tão intenso, irracional, imortal, atemporal


irá somar.


o quanto igual a você eu queria ser, eu queria ter.

Trapiches chegou e arrasou


O n° 1 da TRAPICHES, a revista eletrônica sobre arte e cultura do Projeto Macabéa já está pronta, navegar pelas 22 matérias, dividas pelas seções: Grãos, A Granel, Boneca de Pano, Olho Mágico, Secos e Molhados, Presentes Finos e Perfumaria é ouro puro,entrevistas, crônicas, contos, poemas, críticas, etc... E ainda tem o Extrapiches, que traz – Cais -  sempre com uma seleção de 10 blogs indicados pela Revista. Aproveite e inscreva-se no 1° Concurso Literário e mostre seu talento.


Acessem aqui: www.trapiches.com.br, e boa leitura!


 

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Por quê?

 



 


no silêncio a infância dorme.


respira a indiferença  do mundo.


ouve-se apenas o ronco


vem das entranhas.


nenhum grito acordou a justiça humana.


Uma vítima


do poder, do consumismo perverso


do egoísmo


floresce no canteiro da gaia.


seu destino não é crescer.


poucos notam. ninguém reclama.


todos preocupam com o brilho do céu.


algo mudou de cor.


 


nota: Nada contra os cachorros, pelo contrario amo esses bichos, mas o que a frança e os EUA gastam com ração para cachorro por ano daria para matar a fome de todos os humanos do planeta que vivem em  extrema  pobreza. (UNESCO/2000) Tem alguma coisa que está errada.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

desculpe em !!!!


 


Desculpem a ausência, mas foi providencial


balanço total,


parar com tudo e  meditar


foi a solução encontrada.


de repente a gente acorda do nada


perde tudo... até o chão.


questiona, pensa e pensa.


o que fizemos com nossos dias?


anos?


investimento profissional ...


investimento sentimental  ...


investimento humano ...


sou do século passado e ai ?


me senti a cigarra ( aquela da fábula) fumando cachimbo.


começar de novo, do começo.


batalhar o pão de cada dia


tarde?


talvez


mas necessário.


Puta merda ... como doeu e que MEDA !!!!  


insegurança   da porra   ...


senti perdido...


aposentado sem aposentadoria


MASSSSSSSSSS


sou protegido por arcanjo do bom.


salve miguel, jorge, expedito, josé e maria e  o menino azul dourado.  


Tudo se arranjou.


 


quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Antínoo


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Atínoo-M. do louvre

  • por Marguerite Yourcenar uma obra de literatura-arte dos anos 50, por Adriano, imperador romano, o mais  amado, a tal ponto que o transformaria em um deus, referenciado pela humanidade até os dias de hoje.

  • pelo próprio Antínoo, a total doação.

  • por Édouard-Henri Avril, a inspiração erótica.

  • por Fernando Pessoa, a poesia.

  • por Roma, a alavanca para o progresso das artes, arquitetura, das leis e do imperio.

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 Para constatar a genialidade da obra de Yourcenar, em Memórias de Adriano,um misto de pesquisa histórica romanceada, ficção e realidade, somos convidados a viajar pela vida da autoraMarguerite, sobrevivente de uma paixão impossível por um homem que gostava de outro homem (1936), encontrou e amou Grace Frick(1937), americana, na casa de quem já havia passado um longo inverno. Instala-se em companhia de Grace Frick na solidão da ilha de Montes-Desertos (Maine-EUA), torna-se cidadã americana em 1947. Começa a escrever o romance Memórias de Adriano em 1949 e o termina em 1951, no livro “Ela evoca um homem que constrói sua felicidade “como uma obra-prima”, mas que a paixão pelo belo Antínoo (ou Antínous) e a dor de sua perda vão transformar numa vertigem de imortalidade a glória do ser amado.”A questão é: A obra retrata o momento da autora, inspirada pelos acontecimentos de sua própria vida amorosa, ela se auto-exilou com sua amada Grace em uma  ilha americana,  como se protegesse  a relação dos olhos maliciosos  e do preconceito do  resto da humanidade, na obra, ela foca Roma de Adriano, que foi  antecedido por vários imperadores conhecidos pelas urgias e erotismo que compunham suas vidas amorosas, relata com quase inocência,com total sensibilidade e categoria literária, o amor homossexual de Adriano eAntínoo. O livro nos traz o otimismo de Adriano em administrar o império como um filósofo grego, proporciona a evolução das leis que passaram a dar  direitos às mulheres e amenizava o tratamento  do séqüito de escravos palacianos, era adepto a paz e a conversação com os adversários, fundamentou o sistema educacional para os romanos, era adepto das artes  e de inovações arquitetônicas. Toda a sensibilidade que Adriano utilizou para a evolução administrativa do império foi como uma  reverência ao amor que vivenciou a cada momento da  historia, sem se incomodar com as intrigas da corte e tem o desfecho final a  relação com Antínoo, o mais amado de todos  e a desgraça que gerou sua morte. 

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Situação

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È quase noite, o relógio  espanca o tempo que passou.

Desponta o momento para logo desaparecer na fumaça.

Ele pensa estar flutuando, quase enxerga a plenitude.

A realidade o acorda, encosta a boca suja no peito e suga o leite de tempos

vividos.

Nada sobrou.

Cínica onda que trouxe o prazer, agora enfia no frio do mar e esconde no sal

dos seus olhos.

Torpes pecados povoam a mente, o erro foi nunca tê-los vivido.

O que fizeram dos seus dias?

A porta de correr jamais será aberta, suas mãos agora descansam no ócio

forçado.

Nada a fazer.

Filas, entrevistas e cadastros foram deixados para traz.

O pão fresco, o cheiro do café com leite.

O doce aroma matinal sempre trazia a expectativa do trabalho a ser

cumprido, dias de dignidade se foram e se perderam na crosta do sistema

falido de quem agora tem o poder.

De mãos estendidas reclama a sorte.

Grande delito!!!

dedicar demais, arrebentar o peito na luta e procriar a labuta.     

Expurgo do tempo

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preciso de horas,


deitar e ouvir


o cochicho do tempo,


sentir,


sem chorar,


voltar.


pegar o ar com a boca


e falar,


dissimular a dor,


abrir o passo,


entrar,  


beber,


e compor


versos,


mesmo que sejam tarde.


ainda vou ver


a claridade da aurora


nascer


do tumulto ridículo de ser


um dia


de cada vez.


 


 

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Buno em monte santo

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Inicio o ano lançando o Cada em pleno carnaval, em Monte Santo de Minas, pequena cidade situada no sudoeste do estado. A realização do evento está a cargo do pessoal do Projeto Macabéa, especialmente Alan Marques e André Oliveira. Aproveito a oportunidade para anunciar também a chegada do tão aguardado segundo número da Revista de Autofagia, que finalmente ficou pronto e terá sua pré-estréia nesse mesmo lançamento. Anotem em suas agendas.
Serviço:
Lançamento do livro Cada
Data: 03/02 (domingo)
Local: Casa da Cultura (R. Dr. Pedro Paulino da Costa, 333, Monte Santo de Minas)
Horário: 19 horas
Apoio: Secretaria Municipal de Educação e Cultura / Prefeitura Municipal de Mte. Sto. de Minas
Na ocasião, os livros Cada e Mínima Idéia serão vendidos a R$15,00 e a Revista de Autofagia a R$10,00 cada exemplar.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Quem fim levou gatinha?

miseria4.jpg  


Era filha de elza “a gata”, isso foi lá nos anos 40.


foi criada nas borbulhas dos coronéis do café.


de beleza estonteante


debutou nas coxas de um filho deles.


caiu nas graças até de filho do médico e


engravidou,


sugaram seu ventre e a sua mocidade,


levaram sua cria para europa.


Ela ficou.


seguiu a tradição da mãe,


viveu somente para solidão,  o álcool e


o leito duro.


sarjeta nunca perdoa.


Macabelagem


O anjo agora tá toda quarta-feira  no blog    


literário Macabelagem





Confira "Sem parcimônia"





http://macabelagem.ideiadejerico.com/


quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

O velho e baú


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 Cesário era um velho daqueles que lembram papai noel, o prateado dos cabelos contrastava com a tez avermelhada que era contornada pela barba alva, seus olhos eram dóceis, usava um pequeno óculos redondo com as pernas emendadas com esparadrapo. Era um homem sorridente, mas sabia ter energia nos momentos que assim exigia, tinha um pequeno pedaço de terra nos arredores de uma cidade com pouco mais de seis mil habitantes. Imigrou da Áustria para o Brasil ainda muito criança  na companhia dos pais, em ocasião da primeira grande guerra.  Trouxeram como bagagem apenas um baú marchetado de madeira maciça.


A pneumonia levou seus pais, casou-se com Eulália, a moça mais linda do povoado sulino.  Ela morreu no parto do ultimo filho. Ele ficou só e  uma renca  de 6 filhos, sendo Bernardo o recém nascido.


Francisco o mais velho nasceu em um dia de tempestade, as estradas estavam barrentas e nem cavalo passava, o pai teve que realizar o parto, os outros nasceram pelas mãos da parteira caolha Jacobina. Foram quatro filhos  e duas filhas em oito anos de casamento. Cesário criou os filhos sozinho,  com a dureza de quem planta e espera chover, passou pelos árduos anos de inflação galopante, nunca deixou que faltasse nada do necessário, muitas vezes deixou de comer para alimentar sua prole.


Nunca ficou devendo nada a ninguém.


Nunca fumou nem bebeu, não conhecia bares nem a zona do meretrício, nas suas noites quentes de solidão tomava banho frio na cacimba da gruta, local destinado a meditar e pensar.


Os filhos cresceram, estudaram, se formaram e foram embora formar suas famílias.


Cesário ficou só.


Uma lenda envolvia o velho Cesário, diziam que tinha um baú enterrado na gruta e que lá guardava toda a riqueza acumulada de uma vida toda. Muitos apostavam que no baú havia libras esterlinas de quatro gerações de parentes, outros afirmavam que eram jóias oriundas da família real austríaca e tinham os que diziam que ele havia transformado tudo em um imenso colosso de dólares.  


Os filhos cresceram no meio do convercê  do povoado, Francisco, o mais velho, foi quem primeiro se interessou pela historia do  baú, naquela época com oito anos de idade e assim por diante cada filho questionava o pai sobre o assunto,  Cesário sempre desconversava.


Um dia reuniu todo seu clã e disse: – Vou falar uma vez só e nunca mais tocarei nesse assunto, portanto lembrem bem do que vou dizer. O Baú que todos falam está na gruta, no pé da montanha triangular, em lugar seguro. Lá existe toda fortuna deixada pelos nossos antepassados, um dia ela será de vocês, a maior parte será daquele que for o melhor filho, o melhor cidadão e o melhor cristão.  


O velho apesar de morar só, nunca sentia solidão, todos da cidade o visitava, sempre com olhares para gruta.  Nas piores safras, Cesário era o único  que nunca perdia o  crédito, todos queriam lhe servir. Era convidado para festas, comemorações e inaugurações, mas nunca aparecia. Os filhos estudaram na pequena escola da vila,  depois foram  para faculdade pública da capital. Concorriam entre si para as melhores notas e os melhores empregos. Todos tiveram filho homem com o nome de Cesário. Revezavam-se  no velho sítio para que nunca o pai tivesse solidão.


Nunca esqueceram do Baú.


Cesário caiu doente em um dia de natal, teve o melhor tratamento médico da capital, tudo patrocinado pelo dinheiro dos  filhos. Ficou sem andar, as noras e genros discutiam  e queriam exclusividade para cuidar do doente em suas próprias casas. Cesário optou por ficar uma temporada na casa de cada filho para satisfazer a todos.


O melhor cômodo da casa era destinado ao avô, tratamento de cinco estrelas, remédios na hora, alimentação balanceada e a presença do  médico a cada espirro do velho.


Cesário morreu no dia de seu aniversário de noventa e seis anos, mas não antes de revelar na presença de todos os filhos, o local onde estava o baú e dizer  que todos receberiam a fortuna em partes iguais, pois todos foram bons filhos e cidadãos exemplares.


O funeral foi na vila em que sempre viveu, foi erguido um tumulo de granito branco, o mais caro que encontraram,  uma placa de bronze homenageava o  velho do baú.


A família estava reunida na gruta da montanha, o filho mais velho, com ajuda dos irmãos, empurrou a pedra grande que dava fundo a gruta, retiraram outras pedras menores até que avistaram o baú.


O baú estava envolvido por um plástico transparente amarrado pela boca com uma corda de nylon azul. Era uma caixa de madeira pesada de mais ou menos dois metros por um,  era marchetada em tonalidades negra, marfim e vermelho, os desenhos formavam situações de rotinas domésticas com personagem orientais.A tampa estava emperrada e precisariam de ferramentas para abri-la, as noras pediam para que destruíssem a tampa com auxilio de uma pedra pontiaguda,  os genros optaram por destruir todo o baú para que pudessem ver logo o conteúdo.


A filha mais velha foi quem pediu silêncio e determinou: -Levaremos o baú até a casa de meu pai e lá, vamos abri-lo com a delicadeza necessária para não estraga-lo, afinal, ele pertenceu a varias gerações.


O transporte do baú foi deixado para o outro dia, estava noite e mal enxergavam a estrada de retorno a casa.


Com baú exposto sobre a  mesa da cozinha, Francisco, com auxilio de varias chaves e outras ferramentas,  conseguiu abrir o tampo maciço. 


Todos aproximaram da mesa,  netos, genros, noras, filhas e filhos compartilhavam o acontecimento.


Foi quando Francisco observou que o baú estava completamente vazio, via apenas um pedaço de papel encardido no fundo da caixa: 


"Se o povo for conduzido apenas por meio de leis e decretos impessoais e se forem trazidos à ordem apenas por meio de punições, ele apenas procurará evitar a dor das punições, evitando a transgressão por medo da dor. Mas se ele for conduzido pela virtude e trazido à ordem pelo exemplo e pelos ritos em comum, ele terá o sentimento de pertencer a uma coletividade e o sentimento de vergonha quando agir contrário a ela e, assim, bem se comportará de livre e espontânea vontade". – Confúncio.