domingo, 22 de abril de 2012

O Amor Entre Iguais na história



As tribos das ilhas de Nova Guiné, Fiji e Salomão, no oceano Pacífico, cerca de 10 mil anos atrás já exercitavam algumas formas de homossexualidade ritual. 
Os melanésios acreditavam que o conhecimento sagrado só poderia ser transmitido por meio do coito entre duplas do mesmo sexo. Os jovens destas tribos, com idade de 12 e 13 anos, eram penetrados por seus tios maternos, sendo que o esperma de seu tio seria essencial para se tornarem fortes, e assim passar da infância para a fase adulta.
Um dos mais antigos e importantes conjuntos de leis do mundo, elaborado pelo imperador Hammurabi na antiga Mesopotâmia em cerca de 1750 a.C., contém alguns privilégios que deveriam ser dados aos homossexuais, eles eram sagrados e tinham relações dentro dos templos da Mesopotâmia, Fenícia, Egito, Sicília e Índia, entre outros lugares. Herdeiras do Código de Hammurabi, as leis hititas chegam a reconhecer uniões entre pessoas do mesmo sexo. E olha que isso foi há mais de 3 mil anos.
Na cidade-Estado de Atenas, os filósofos (Erastes) colocavam o envolvimento sexual com seus aprendizes (Erômenos) como um importante instrumento pelo qual se estreitavam as afinidades afetivas e intelectuais de ambos. Entre os 12 e os 18 anos de idade o aprendiz tinha relações com seu tutor, desde que ele e os pais consentissem com tal ato. As relações entre homens da mesma idade não eram aceitas.
No Império Romano, o desejo sexual que se tinha dos jovens era altamente aceitável, o amor entre um romano e um jovem livre não era bem aceita, ainda que popular, sendo que este tipo de relação era punido com multa, contudo, o amor de um romano e um escravo não sofria nenhum tipo de restrição. Nesta sociedade também existia uma repulsa com relação ao homem romano que adotava a condição de passivo, ou seja, mantinha-se a mesma concepção que o gregos tinham a respeito a passividade, que esta só deveria ser típica de mulheres, jovens e escravos. Porém esta desaprovação não era absoluta, exemplo disto é a de Júlio César, que mantinha um caso com Nicomedes, rei de Bitínia, além de Cleópatra a rainha do Egito.
Não só nestas duas grandes civilizações, Grécia Antiga e Roma, que se verificavam as relações homossexuais de forma natural, o mesmo também ocorria no Oriente. Na Índia, que em razão dos deuses serem afetiva e sexualmente bissexuais acabou por influenciar a população no mesmo sentido. Na China também se verifica que as relações homossexuais eram tratadas de forma natural. A homossexualidade era influenciada por seus imperadores, o mesmo ocorria no Japão, que não tinham uma visão pecaminosa das relações homossexuais.
Com a assimilação do valor estritamente procriador do sexo, disseminado pela cultura judaica, a concepção sobre o ato homossexual foi ganhando novas feições.
Foi no século V, com Justiniano que surgiu as primeiras leis de repressão à homossexualidade, que apenava os seus praticantes com a castração e fogueira.
“A igreja católica reprovava a homossexualidade com maior intensidade no século XII, porém, alguns estudiosos entendem que a repressão em relação ao homossexualismo estava ligado mais a uma questão política que religiosa, já que prisões sob essa acusação eram um método conveniente para afastar pessoas indesejáveis.”
Ainda assim – ao longo da Idade Moderna – tivemos vários relatos de representantes da nobreza tiveram casos com parceiros e parceiras do mesmo sexo. Ao tempo, notabilizou-se a paixão de Ricardo I, Coração de Leão, da Inglaterra, por Felipe II, da França (1157-1199).
No curto intervalo entre 1347 e 1351, a peste negra assolou a Europa e matou 25 milhões de pessoas. Como ninguém sabia a causa da doença, a especulação ultrapassava os limites da saúde pública e alcançava os costumes. O “pecado” em que viviam os homens passou a ser apontado como a causa dela e de diversas outras catástrofes, como fomes e guerras. Judeus, hereges e sodomitas tornaram-se a causa dos males da sociedade. Não havia outra solução a não ser a erradicação desses grupos. Medidas enérgicas foram tomadas.
Em Florença, por exemplo, a sodomia foi proibida em 1432, com a criação dos Ufficiali di Notte (agentes da noite). O resultado? Setenta anos de perseguição aos homens que mantinham relações com outros. Entre 1432 e 1502, mais de 17 mil foram incriminados e 3 mil condenados por sodomia, numa população de 40 mil habitantes.
Leis duras foram estabelecidas em vários países europeus. Na Inglaterra, o século 19 começou com o enforcamento de vários cidadãos acusados de sodomia. E, entre 1800 e 1834, 80 homens foram mortos. Apenas em 1861 o país aboliu a pena de morte para os atos de sodomia, substituindo-a por uma pena de dez anos de trabalhos forçados.
Também no século XIX a efervescência das teorias biológicas e o auge da razão como verdade absoluta, queriam dar uma explicação científica para o homossexualismo, a expressão “homossexual” foi criada em 1848, pelo psicólogo alemão Karoly Maria Benkert (“Além do impulso sexual normal dos homens e das mulheres, a natureza, do seu modo soberano, dotou à nascença certos indivíduos masculinos e femininos do impulso homossexual(...). Esse impulso cria de antemão uma aversão direta ao sexo oposto”.) Em 1897, o inglês Havelock Ellis publicou o primeiro livro médico sobre homossexualismo em inglês, Sexual Inversion (“Inversão sexual”, inédito no Brasil). Como muitos da época, ele defendia a idéia de que a homossexualidade era congênita e hereditária.
 No século XX, a lobotomia cerebral foi declarada como uma solução cirúrgica para que quisesse se “livrar” do hábito. Desenvolvida pelo neurocirurgião português António Egas Moniz, que chegou a ganhar o prêmio Nobel de Medicina de 1949 por isso, na Suécia, 3 mil gays foram lobotomizados. Na Dinamarca, 3500 – a última cirurgia foi em 1981. Nos Estados Unidos, cidadãos portadores de “disfunções sexuais” lobotomizados chegaram às dezenas de milhares.
O tratamento médico era empregado porque a homossexualidade passou a ser vista como uma doença, uma espécie de defeito genético associado a problemas mentais na família. A teoria, junto das ideias emergentes sobre pureza racial e eugenismo nos anos 1930, torna fácil entender por que a lobotomia foi indicada para os homossexuais.

A situação só começou a mudar no fim do século passado, quando a discussão passou a se libertar de estigmas. Em 1979, a Associação Americana de Psiquiatria finalmente tirou a homossexualidade de sua lista oficial de doenças mentais. Na mesma época, o advento da aids teve um resultado ambíguo para os homossexuais. Embora tenha ressuscitado o preconceito, já que a doença foi associada aos gays a princípio, também fez com que muitos deles viessem à tona, sem medo de mostrar a cara, para reivindicar seus direitos. Durante os anos 80 e 90, a maioria dos países desenvolvidos descriminalizou a homossexualidade e proibiu a discriminação contra gays e lésbicas. Em 2004, o Supremo Tribunal dos Estados Unidos invalidou todas as leis estaduais que ainda proibiam a sodomia.
“Em toda a história e em todo o mundo a homossexualidade tem sido um componente da vida humana”, escreveu William Naphy, diretor do colégio de Teologia, História e Filosofia da Universidade de Aberdeen, Reino Unido, em Born to Be Gay – História da Homossexualidade. “Nesse sentido, não pode ser considerada antinatural ou anormal. Não há dúvida de que a homossexualidade é e sempre foi menos comum do que a heterossexualidade. No entanto, a homossexualidade é claramente uma característica muito real da espécie humana.” Para muitos, ainda hoje sair do armário continua sendo uma questão de tempo. As portas, no entanto, vêm sendo abertas desde a Antiguidade.

 

 fotne: Born to Be Gay – História da Homossexualidade, William Naphy, Edições 70, 2006

O Amor Entre Iguais, Humberto Rodrigues, Mythos, 2004


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